quinta-feira, 4 de julho de 2013

O Tempo



A minha vida é feita de uma sucessão de esperas. A cada ritmo compassado do músculo que dá vida, a mesma sonoridade insistente, persistente e enlouquecedora de cada segundo, a bater num tambor descompassado interno que agita e dispara músculos e peito numa vigília desnecessária e sofredora. E o tempo comanda-me, deixando-me sem dignidade para agir com o meu ritmo biológico certo. Quando tudo te governa numa cadência rápida e agitada e para tudo tens de estar alerta, tudo se sucede com rapidez, numa luta sem termo e não se avizinha a esperança e o descanso repousante. O desgaste derruba-te numa prisão de cansaços que te privam o sono, te quebram os movimentos, te incapacitam de pensar e até de sentir, quando, num momento de rara beleza como esta, hoje, de agora e de sempre, espero, não há mais força para sorrir e dançar.

Os barulhos persistem no silêncio e já sentes que do vazio dá lugar um preenchimento aprisionado e asfixiante que te queda a respiração. Porque o que tenho não é aquilo que desejo; quando, o que conquistei, a sangue e lágrimas, suores e batidas, materialmente é nada e, agora, mais do que em qualquer outro dia, olhar adiante faz-me temer a possibilidade de ser capaz de alcançar. E parece tudo tão longínquo pensar no que amanhã será, como é viver a eternidade do Amor, sarar feridas do passado com calor, chá verde, lareira e xaile aos ombros, o antes, a preciosidade das crianças, de gerar, procriar, construir personalidades, editar mentes, estimular inteligências – Dar Vida! Como é? Como será a minha quietude então, se já, no presente aparentemente tranquilo e neutro, cercam-me aflições? Como serão as noites não dormidas, não pelo som dos segundos já interiorizados, mas pelo choro do produto de um Amor puro? Quem serei então? Quando a vida, de tenra, ainda não me impulsionou para a maturidade total, como se avizinha esse além tentação, como se vive diante do sonho, dentro do sonho, no contexto do sonho, penetrado no sonho? Como serão consequenciadas as minhas lacunas, o vazio do que não se construiu, a irregularidade de humores e sensibilidades, a inconstância de um sentir, rotativo e cíclico que sempre se fechou e se abriu no mesmo ponto? Como saberei ser diferente quando diferente ainda não sou e receio desconhecer o caminho até lá chegar?... E quando, pelo inverso, da face esbelta da beleza de um sonhar, se afigurar o desequilíbrio e a rutura de, afinal, nada construir? Se o Amor, a estabilidade, a paz, o cheiro dócil do terno cuidar, afinal não me saciarem a sede? Solidão! É este o ponto de viragem daquele momento em que estás diante de dois caminhos: um radiante e soalheiro que se afigura mais real, e um outro de penumbra e desfiguração que temes e receias nada permitir lá chegar. E tudo se resume à palidez da vida diante do sermos sós. E, todo o momento, fugimos de cair nesse poço fundo, sem luz possível, sem caminho próximo ou secundário, dando-nos conta que a solidão é a mais temível de todas as realidades humanas. Ávidos procuramo-nos uns aos outros, cercamo-nos, vivemos em comunidades, comunicamos e sorrimos para bom grado, ajudamos e acariciamos para uma troca justa e necessária. Ninguém vive só. A Felicidade é inimiga da Solidão. Não que nos alicerce nos maneirismos mais corretos de agir com os outros, não que saibamos amar e fazer esforços para fazer felizes aqueles além, iguais, coloridos ou gigantes, rainhas ou pedintes, tolos ou intelectuais, mas ambicionamos a companhia, o colo, o aconchego, as palavras e ternuras, dadas, oferecidas, gratuitas, entregues a nós, giratórios e centrais no mundo… sozinhos, de fato. Todos o somos, raízes soltas que almejam alcançar os frutos e fazer semear poléns para germinarem em gerações múltiplas, elas também habitadas na solidão, num ciclo sem fim de limitações e vazios.

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