quarta-feira, 9 de junho de 2010

Ouvi Dizer


Ouvi dizer que o nosso amor acabou
Pois eu não tive a noção do seu fim
Pelo que eu já tentei e não vou vê-lo em mim
Se eu não tive a noção de ver nascer o homem.
E ao que eu vejo, tudo foi para ti
Uma estúpida canção que só eu ouvi
E eu fiquei com tanto para dar e agora
Não vai deixar nada bem que eu pague outra raiva

Se eu pudesse pagar de outra forma
Se eu pudesse pagar de outra forma
Se eu pudesse pagar de outra forma

Ouvi dizer que o mundo acaba amanhã
Eu tinha tantos planos para depois
Foi eu quem virou as páginas na pressa de chegar até nós
Sem tirar das palavras seu cruel sentido
Sob a razão estava cega
Resta-me apenas uma razão
Um dia vais ser tu e um homem como tu
Como eu não fui
Um dia vou-te ouvir dizer.

A cidade está deserta e alguém escreveu o teu nome em toda a parte
Nas casas, nos carros, nas pontes, nas ruas
Em todo o lado essa palavra repetida ao expoente da loucura
Ora amarga, ora doce,
Para nos lembrar que o Amor é uma doença
Quando nele julgamos ver a nossa cura.


- Ornatos Violeta -

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Nostalgia


No plano da reflexão, liberta de estereótipos, de crenças, de ilusões, de falsas evidências e após me retirarem a roupa e me mostrar nua, ainda assim me sinto coberta. O meu eu verdadeiro, a minha essência foi desde cedo negada e reprimida. Não me acorrentaram, não me sangraram, não me pontapearam. Fizeram pior – não me viram! E fui o ideal desejado por ambos, a perfeição, a cumplicidade manipulada, o Amor desconhecido, a dependência na fusão, a personificação de todas as faltas, de todos os défices, de todos os sofreres. A qualquer sinal de individualização, de vontade de revelação, houve castigos sim, estalos no coração; violência física, não; psíquica, pior. Para manter o nosso “amor” percebi, por fim, que devia existir na negação de mim. A supra valorização de vocês, gigantes, e o esquecimento de mim. Tive vontades não satisfeitas, houve lágrimas caladas para o não desilusão, houve gritos surdos, houve tanto afecto por receber… O meu papel? Dar. Revoltar-me seria perder a única ligação e (não) relação que me mantinha no mundo!
E dali, negada e aceite na minha condição já interiorizada, muitos se passaram, lhes dei o todo e deles o nada. Padrão mantido. Causador de sofrimento, sem dúvida, mas já sabido, já expectável. Até que no ¼ de vida te conheci e sem perceber, roubaste-me a alma. Não percebi, não reagi, não limitei a tua entrada. E, uma vez dentro, percorreste o fosso, escuro, de mim e chegaste, apenas tu, inédito, às profundezas. Incomodaste-me. Como o conseguiste com essa rapidez? E de ti, para ti, único, fui pela primeira vez EU e, surpreendentemente, aceitaste e acolheste-me na fragilidade e no meu inchaço de fantasmas. Não repudiaste! Não ignoraste! E no depois, pelo físico, me voltaste a invadir, no lume do prazer também ele até então desconhecido. Como perceber o poder que dominas e a facilidade com que o fizeste? Como esquecer o primeiro a conhecer-me? O primeiro que embora me conhecesse, me abandonou, ainda assim? Da noite para o dia, ciclicamente até à morte, eterno, ainda que ausente!

Ouve-me


Incansável bati
E aguardei, paciente
Aquele ouvido que insisti
Do cego ausente.

Gritei depois no urgente
Toda a esperança incuti
Coberta de contente
A todos menti.

Com a lágrima competi
No medo da noite
E fracassada, desisti
Do doce horizonte.

Sobejou o incoerente
Da verdade que investi
Enfim em exponente
Para o amanhã indiferente.

02/06/2010

Eu sei


Se eu voar sem saber onde vou
Se eu andar sem conhecer quem sou
Se eu falar e a voz soar com a manhã
Eu sei…
Se eu beber dessa luz que apaga a noite em mim
E se um dia eu disser que já não quero estar aqui
Só Deus sabe o que virá
Só Deus sabe o que será
Não há outro quer conhece
Tudo que acontece em mim.

Se a tristeza é mais profunda que a dor
Se este dia já não tem sabor
E no pensar que tudo isto já pensei
Eu sei…
(…)
Na incerteza de saber O que fazer, o que querer
Mesmo sem nunca pensar
Que um dia eu vou espessar.

- Sara Tavares –