domingo, 9 de março de 2008

Cedovim de Amor Lendário


Ana era a filha mais nova de um casal burguês, que vivia no seu majestoso solar, rico e poderoso, em Cedovim. Moça de requinte, dócil, educada, humana, generosa para com os mais necessitados, era a filha com as características mais apreciadas pelos pais. Desde tenra idade, demonstrou ser perspicaz, segura de si, dos seus mais profundos desejos… Temperamento calmo, confiante, sempre triunfante… belíssima! Seus cabelos loiros como raios de luz, estendiam pelo ar seu perfume de flores, suave. Seu andar mais parecia um bailado, uma dança celestial. Tocava piano e, fechados os olhos, a imagem era de um anjo sob uma nuvem tocando harpa, soltando o som em ondas circulares, tão leve e finíssimo… flutuando por entre os leves contornos da sua janela de quarto fechada. Tinha já os seus 18 anos. Perfumada de Amor, brotavam paixões de todos que por ela passassem. Seus pais, austeros, reclamavam sua leveza, sua emancipação. Deveria casar-se com um homem do mesmo escalão social, não um qualquer. Mas ela, de uma simplicidade imensa, apenas desejava amar e ter filhos. Casar com homem amado, reunidos em paixão e muita devoção.
Certa vez eclodiram a Cedovim um exército de soldados, tenentes, oficiais ingleses para permanecerem até inicio de novos combates. De sua timidez natural, interessada e curiosa, espreitava por entre sua janela do quarto por aquele, que de entre todos se destacou – o tenente Willis. Serões de convívio entre a família fidalga e os cavaleiros despertaram encanto similar no tenente que, esquecido de si e de sua missão, nunca vira beleza igual, pessoa com tão grande irradiar, com tão celestial encanto. Pequenos sorrisos escondidos e disfarçados, olhares apaixonados… Dia após dia o Amor se tornava mais e mais avolumado, mais denso, mais persistente, mais inquebrável. Através dos empregados do seu pai, a Ana conseguiu finalmente que o seu primeiro manuscrito lhe fosse entregue, ao tão amado Willis. E assim, por troca de cartas, no mais puro sigilo e no total desconhecimento dos pais, Ana segredava os intentos do pai em desposar em breve com um fidalgo da região, muito influente, mas que ela, negando firmemente, o desejava apenas a ele. Willis tomara então uma decisão aquando do seu chamamento para a frente de novo combate em terras distantes: que voltaria e fugiriam os dois, para se amarem eternamente.
Sempre regressou em saudosos e penosos 10 dias de sofrimento de Ana, acompanhado com mais dois colegas do Exército. Ela, desejosa de ter em seu redor os braços fortes de Willis, saiu pela janela do seu quarto, em plena madrugada, com o maior cuidado e silêncio possíveis. Tomando-a nos braços, partiram a cavalo, tão leve como se asas possuísse. Que alivio agora poder amar aquele que seu coração escolhera, sem imposições de terceiros. Amá-lo-ia para toda a sua vida, tal era seu encantamento. Willis correspondia com total carinho e, embora lhe pesasse tirar de seu lar moça tão amada pelos seus pais, era a única forma de a ter para sempre consigo.
Manhã seguinte, a mãe de Ana, Maria, pressentindo que algo de mal acontecera, estende suas mãos finas e delicadas sobre a porta do quarto de sua filha tão querida e o que vê são apenas lençóis entrelaçados pela janela deixada aberta pela sua fuga. Gritos de horror, de dor, de padecer, de tristeza sem limites… Sua filha, Ana, dentre todas as filhas a mais querida, a mais inteligente, a mais afável, a mais parecida consigo… se fora embora com um qualquer… O marido, António, cavaleiro, de educação rigorosa, firme, imparcial, de desamor vivido, sabendo do sucedido mandou que perseguissem os fugitivos e que a filha e o tenente fossem mortos, sem dó! Ao passo desta tão dolorosa decisão, reprovada pela esposa Maria, deprimida num desespero em lágrimas demonstrado, mandou que seus homens vedassem com pedra e cal as janelas do quarto por onde a filha fugira, simbolizando a sua morte prematura e já certa.
Enquanto isso, Ana fora para bem longe com Willis e cedo se casaram, selando num beijo um amor inimaginável e que jamais alguém conseguiria destruir. Momentos felizes viveu com seu tenente, que premiado, passou a oficial. Acompanhava-o para toda a parte, onde quer que ele tivesse que combater em guerra. Ao passo de um mês de fugas, engravidou. Seus corações ainda mais se uniam com tão doce privilégio, ter já uma descendência, fruto do mais puro querer, aquele que levou Ana a deixar a vida abastada e rica que possuía, para agora se acomodar em tendas ou outras provisões pouco confortáveis, padecendo por vezes de alguma fome, sede, frio, enfermidades até.
Ana fora deserdada pelos pais e só poderia viver de seu amor, único consolo, somado à alegria que lhe vinha de um ventre onde nasceria a alma feliz de um querer além fronteiras, além restrições, além imposições sociais e temporais.
Pois que passado 6 meses após a fuga, por fim os homens do fidalgo António, pai de Ana, encontraram Ana e seu legítimo marido num acampamento durante a noite mais profunda e triste. Providenciaram um padre que, pela força de uma espada apontada sobre seu peito, lhes deu os últimos sacramentos para que a vontade de António Aguilar fosse cumprida. Enlouquecidos de desespero, uniram mãos, Ana gritando pelo seu Amor e pelo seu rebento ainda em formação, não poderia admitir tamanha crueldade do seu pai, tamanho ódio em gestos demonstrado. O padre, prolongando os sacramentos para que cedo amanhecesse e fossem ouvidos pelo Exército de Willis, que lhes prestaria apoio, foi ameaçado pela sua vida ser pronta a sua tarefa sem compaixão pelos pecadores que amarrados, gritando, lhe suplicavam ajuda. O veneno da desonra por seus lábios, entre relutância maior, assim os fez sucumbir, aos três, Ana, Willis e o rebento de um amor tão puro, mas igualmente tão amaldiçoado pela sociedade.
Maria, sabendo da morte da filha, padeceu e cedo se entregou igualmente à morte por não ser capaz de conviver com aquele que era seu marido e que com sangue mais feroz e frio, matara a própria filha, a mais querida, a mais bela, a mais graciosa, a que com um sorriso iluminava todo o solar. Amor que de puro mata e destrói famílias, laços de sangue, tudo pela tentativa de fuga à desonra social… Lendária história para posteriores pensamentos e sobre a prova do poder do Amor!

5 comentários:

mariamar disse...

Gostei muito da historia, mas, pelos dados que tenho e se me permite não foi bem assim; foi muito mais longa...tão longa que a sua descendencia chegou até aos meus filhos. A Ana Ludovina viveu muitos anos de deixou larga descendencia.
Luisa Ferreira

Anônimo disse...

kem ès? engracado encontrar um decumentario assim por azar na internet...

Anônimo disse...

A história foi muito bem romanceada, mas a história verdadeira de Ana Ludovina não foi tão trágica e felizmente deixou descendência (7 filhos). O seu pai não se chamava António, chamava-se Francisco. Waldron Kelly é o verdadeiro nome do marido de Ana Ludovina.
Mas o romance neste blog está muito bem escrito, embora seja ficção e não factos reais.

Maria disse...

Eu cresci em Cedovim e sei que a história não foi trágica. Há, inclusive, um livro que fala um pouco da história de Ana Ludovina. O casal passou muitas necessidades mas teve vários filhos.

É sempre bom ver referências à minha terra de coração :)

Maria disse...

Aqui está um pouco mais da verdadeira história de Anna Ludovina: http://anterodealda.com/blog/blog_a_pomba_de_cedovim.htm

Estou de acordo com o(a) anónimo(a) que disse que a história foi muito bem romanceada e que está muito beme scrito neste blogue.