segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Bailarina de Guarda-Jóias


Novamente na vivência do vale da curva sinusóide me encontro, no cíclico bater cardíaco aguçado pelo nervosismo, ansiedade e inadaptação. Do sol de ontem, hoje a noite fria e a solidão. Ninguém está. E revejo-me ao espelho, a mesma – bailarina que balança no guarda-jóias aveludado preto ou vermelho rubro. Continuo eternamente naquele ciclo de movimentos repetitivos, estanques, circulares, regulares. Da aparência chamam-na bela, doce, graciosa, alegre, frágil, inocente e vulnerável. Os menos sábios estão capazes de dizer que ela, em mim, é feliz. Disparate. Rodopia, aparentemente enérgica, com vivacidade, animada pela vida, num fim sem vista. Está, de facto, exausta. Porque o esconde, então? Quem a escutará se o confessar? O papel dela é apenas esse: embelezar e dar elegância ao meio. É agradável vê-la e observá-la, no entanto. Move-se com graciosidade. Pacífica. Reconforta. Baila para quantos a observarem. Não pede chamamentos. Quando precisa de se dar corda, aborrecem-se e fecham a caixa. Calam-na. Esse não é, afinal, o seu papel. Não aquele que a incumbiram. Pior é, enquanto se balança, pessoas mil, com indicador estendido, sinalizando gozo e autoridade, a derrubam. Está movida por uma mola e o esforço é mínimo para a fazer cair. Altiva, teimosa e não expressando dor, erga-se sempre. Nem sabe ao certo porque o faz. Num instante está novamente erguida, cabeça ao alto e braços no ar, abarcando mundos e pessoas, dançando com leveza, aparentemente indiferente aos olhares malsins. Não pestaneja. Não chora. Não reage. Congela. Mantém seu labor, cerrando os dentes. Está sozinha junto a jóias inertes, sólidas e desvirtuadas. Gostaria de alcançar mais, fazer diferente. Não lhe dão margem. Não a julgam capaz. Habita na escuridão do veludo desde sempre. Não conhece outro além. Falam-lhe que há aqueles que balançam entre gentes, aplaudidos. Falam-lhe que há cor e luz. Não percebe. Teme o mais. Sempre igual ao ontem. O que a move? Se o amanhã desconsolará igualmente? Se depois será posta no lixo, cansados de a ver? Se sabe à partida que nada mais há nela que apenas uma breve sedução? Continua, sim, porque é única a fantasiar-se melhor do que apenas isso. Dizem-lhe, a miúde, palavras belas de glória e enaltecimento. Ouve mas adianta o fim nulo. E está correcta. Assim se processa. Já nem o bom se contenta; não investe, sabe-o fugaz. Sonha maior, a arte no respirar o balançado encantar, as gentes acolher, o mundo abarcar. Como lá chegar? Qual o caminho? É vago. Precisa de um traçado mais firme e decidido. Não encontra respostas. O que deseja, no concreto, é obscuro. Procura e há vazio. Nem a energia existe. E tudo à roda rodopia, sem nexo, sem sentido. Tortura. Em busca dela. Há-de valer a pena! Só ela, imensa e bastante, o confirma. Basta? Não. Mas segue…sempre.

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