sábado, 11 de julho de 2009

Interrogação


Sinto-me cair devagar. A cabeça rodopia, o pensamento faz-se por empurrões e solavancos; nada faz sentido, um nada alicerce. Nestes pensamentos que me torturam e que caminham insolenemente assaltando-me a felicidade que desconheço e procuro e sei ser impossível. Sempre surgiram e surgirão quem olhe e veja aquela beleza sedutora e atractiva, talvez nos meus olhos azuis e nos meus dentes brancos e elegantes. Ou então naquele vestido vermelho sob aquele sapato alto preto que me faz maior e mais cativa. Mas, haverá solidão maior do que esta? Todos te procuram e te nomeiam, todos te elogiam e bajulam, mas dentro de ti aquele vazio existe e sabes que jamais o conseguirás arrancar, apesar do ioga e dos passeios sobre o verde da natureza maior. O que esperas tu se é que a vida já não te ensinou que quanto mais se espera menos se tem? O que podia cobrir essa falha que sentes dentro de ti, em parte alguma do teu ser? Cada gesto que digas ou faças, cada expressão, cada suspiro escondido, cada semblante te será sempre objecto de minuciosa análise e re-teste. Sim, porque sabes que muito embora erres, vais continuar a insistir naquilo que mais afundará, que mais te quebrará. E há alguém que te recorde naquelas noites sombrias, onde lá fora a chuva cai e se ouve uivar aqueles que desprezas? Pensarás que talvez eu seja melhor no meu lastimar mudo? Ou entenderás que por te escutar a ti e a todas as almas, vivas ou mortas, que em queixume e feridas te rogam pedidos e te imploram uma mão? Saberás ver a tua insignificância? E saberás ver, para cúmulo da miséria da existência e sua extrema superficialidade, que é insano pensar que na pós-vida te valorizarão? Não te iludas, fanfarrão! Cultiva aqui e poderás semear e se tiveres atento pelos furtos certos poderás colher umas ramagens secas. Desejas mais? Mais o quê se em ti alguém de omnipotente e poderoso te escreveu, nas tuas costas que pesadas curvas, a sentença garrafal de que “não te esforces, não vale a pena”. Soluçares roubar-te-ão a vida, e envelhecerás mais do que aquilo que estás capaz de o fazer entender a olho nu. Alguém te disse, certa vez, que parecia impossível carregar tamanho peso e que estranhava esse sorriso ingénuo e parvo. Com toda a razão se apercebeu da capa e da máscara e do lençol e do sapato de lã e da invisibilidade de ti. Chorar pesa também e nada do que faças parece ter um caminho com vista ao melhor vindo. E nestas estranhezas do nada que és tu, vês-te ao espelho e encontras a beleza enfeitiçada que desejaste em adolescente e que agora apenas te tem atrapalhado. E deixas de perceber o porquê de estares aqui, já que colocaram barreiras a todas as possíveis saídas. Voltar atrás seria inviável porque teimas ser um “andar para trás como o caranguejo”, como tantas vezes te martelou a tua professora naqueles tempos em que pouco percebias da vida recém iniciada. E isso talvez te tenha traumatizado ou bloqueado no sentido da marcha atrás. E reflectes que talvez seja melhor o esperar na turbulência dos dias sem rumo que surja aquela luz divina que se diz existir. Mas, tens vindo a reparar no interessante da injustiça e desigualdade e não percebes, como não percebes nada, como nunca irás perceber em tempo algum o que rege isto, o que movimenta aquilo e o que te leva, ainda hoje, a persistir por cá na ânsia do além que te responde por pontos de interrogação sem nem mesmo ele saber o que há-de fazer contigo, pobre triste.

11/07/2009

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