domingo, 1 de março de 2009

Superação


De postura cabisbaixa, sentada sob o surdo ruído, deixa que as lágrimas revelem o que as palavras calam pelo isolamento e anonimato de um humano vulgar. Desejando o fim maior, no cume da angústia, pois que da recente vida que tem e nutre, apenas desilusões sucessivas quebraram a sua passada. E parou diante delas, travando lutas, tempos de íntima cura, de desconhecida batalha. E, sangrando e com graves feridas, agarrou o solo que a arrastava e esmagava e fê-lo poisar sobre seus pés, como é suposto estar. Noutras alturas enterrou-se na água salgada e saboreou o acre, o azedo, o amargo, o fel. E apreciou-se no desterro da culpa, pelo não merecimento, pela inglória e fez-se isolar, afugentando o bem dos demais… raros.
Um vulto feminino aproximou-se e falou-lhe no seu valor, na vitória do sol sobre a tempestade, da vida desafiante e nunca inútil, no isolamento para melhor reflexão, na felicidade conquistada e necessário merecida e nos quantos aguardam por ela. Aí, fez-se lavar em lágrimas, vencendo às feições do seu rosto e pronunciou com dificuldade entrecortada, “Anjo meu…”, ao que a figura responde: “Não sou… sou igual a ti… repete o que agora te disse a quem vires necessitado de aconchego… vai ao encontro de quem te espera!” E partiu, deixando-a só no seu pequeno lugar, ignorada pelos transeuntes indiferentes. E, balanceada pelo bem de prosperar como a figura angelical aconselhara, conseguiu forças capazes de se reerguer. Mas, ainda assim, a sua figura transparecia dor na alma, dor passada, dor infinita, dor oculta. E uma criança viu-a e olhando-a com ternura imensa, cruzou-se com o seu olhar triste e apontou-a, imersa na multidão imensa, como “a mais bela de todas”. Sensível, percebeu o que Ele queria transmitir através destes seres preciosos e continuou a caminhar. Sorrindo timidamente às pombas, às gaivotas, ao idoso prosseguiu e encaminhou-se para o seu dever mundano.
Entrou pelo edifício e por ela inúmeras crianças desconhecidas abraçaram-na ao seu encontro, famintas de um gesto de carinho e ternura de quem quer que fosse, quando seus biológicos progenitores as abandonaram. Chamaram-na de “tia” e sentiu o seu peito encher. Beijou e fez adormecer nos seus braços o bebé gracioso e, para seu espanto, ainda mais indefeso e vulnerável que ela mesma. “Nunca estarás só” acariciando-a com estas palavras na voz mais sincera e pura que encontrou em si. E o bebé adormeceu num sono tão repousante que a tranquilizou também. Beijando todas e prometendo sempre regressar, amor deu aos pequenos seres, sentindo cada abraço como a melhor das dádivas. Sorriu e com uma lágrima, desta feita, animada, deu-a para festejo de todos. O coração voltou a bater sentindo-o forte. Lá fora as ruas mantinham-se cinzentas, ninguém reparando nela, mas abraçou-se, sentindo-se única e especial, sorriu a todos que mesmo sem lhe darem valor, mesmo pisando-a, não lhe atingiam o seu ego forte e brilhante. E foi feliz, consigo e com o seu “eu”, suspensa na ignorância e incompreensão que marcam a sua plateia. Não mais se esmoreceu porque sabe que um dia procurá-la-ão pela luz que a invade por dentro.

28/02/2009

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