Henrique, voltado de costas para a janela do seu quarto, para os raios de sol que rebentavam com toda a sua força e calor sobre os seus membros, fixava os olhos no chão, reflectindo os seus dezassete anos. Um adolescente perspicaz, sensível, meigo, com alma de gigante, tinha entretanto motivos que lhe entristeciam o olhar. Educado de forma rígida, extremamente correcta, onde a liberdade estava entre extremos limitada, mas onde o Amor existia, embora envergonhado.
Henrique perguntava-se que rumo à vida dar, o que tem como missão viver, o que significa caminhar, o porquê dos objectivos.
Aluno do 12º ano, onde as escolhas são obrigatórias, onde a ânsia aumenta, onde o futuro, essa palavra tão banal, mas igualmente tão irreal, tão “inconcreta”, é decidido, onde se julga depois de tomado um rumo, a rota não mais volta atrás. Dezassete anos de uma vida serão suficientes para que boa decisão do que há de mais precioso – a vida –, seja traçada? Oh, que responsabilidade! Sentia-se num beco sem saída, encurralado, perdido, desanimado, sem saber o que fazer e, mais que tudo o resto, desamparado!
Vida escolar cruel! Rotulado através de um número, por cada professor (detentor de sabedoria), de cada disciplina, muitas delas enfadonhas, aborrecidas, inúteis! Para quê tanto estudo naquilo que, no essencial da tal palavra fatal – o futuro – será irrisório?! Revoltado! Testes infindáveis, avaliações supérfluas das reais capacidades, motivação não estimulada, apoio encoberto… Dezassete anos! Para além de um desajuste entre ele e os colegas; eles excêntricos, perversos, infantis, desmemoriados das consequências dos seus actos para o tal… futuro! Ele maduro, por circunstâncias de vida formado, vivendo num mundo de leves, brandos e criativos sonhares, ilusionista de ideais, criador de personagens, em rascunhos de livros desenhados. Poucos amigos, talvez, mas do melhor! Desejaria mais, mas o mais é indecifrável… o que será que precisaria para lhe encher o seu tão precioso coração?
Um Amor longínquo, não dito, não verbalizado, colado à garganta durante tempo suficiente para sofucar… Ela mais velha, mas de una maturidade igualada! Em tamanha perfeição a pintava, suavemente a pincel, nas profundezas do seu coração e no invisível do seu pensamento.
Alma, num sumar, perdido, destroçado e na essência, sozinho… Um sozinho por entre tanta gente, como Luís de Camões tão bem soubera dizer. Assim ele era, Henrique, um génio recolhido, alma pura e angelical incompreendida. Tão doce ser!
Paixão pelo regresso a Inglaterra, o sonho maior, para além da arte em palavras escritas em livro, quiçá, publicado.
Certo dia, naquele em que reflectia voltado sobre o sol, uma ideia sua alma encheu. Pensou:”Serei eu um idiota? Hum… Os resultados nos testes não são muito famosos, tenho de confessar, mas… meu amor inglês, a Inglaterra sonhada, como os conquistar? Paixão existe apenas em livros, certo é, porque não aprofundar, recriar, fantasiar, dar asas às palavras, colá-las em folhas, projectos empreender… Será que do fazer o melhor que se sabe se atinge o outro patamar, esse caminho mais penoso que é saber o que o futuro (que palavra tão densa e saturada) me é capaz de dar? Serei capaz? Tentarei!” – sorriu e voltou-se nesse mesmo instante para o que o sol lhe oferecia, cerrou os olhos, emocionado porque, naquele tão insignificante de pureza momentâneo soube o que era viver! - “Viver é desfrutar este sol, sentir o seu calor, desfrutar o que meus olhos de belo podem ver, sentir a ligeira brisa fazendo cócegas ligeiras na face, ver a luz que cada pessoa emana e, a partir daí, seguir por um caminho”. Imaginou a vida como uma árvore de tronco forte, enraizada ao solo, carregada de flores e frutos, pesada, densa, alastrada pelos seus imensos troncos, cada um mais fascinante que outro mas, do esplendor, a sombra se via que a árvore produzia sob si mesma. – “Serei sombra? Serei luz? Luz, claro que sim… LUZ! E uma luz tão pura como o sol, tão natural como ele, que dá vida!” – comoveu-se, tão amável Henrique.
A partir de então, todos o comentavam: “Que se passa com o Henrique, parece que ganhou nova vida!” E de facto, verdadeira mudança, igualmente estranha de tão repentina. Que vivia nele, dessa aparente mudança? Soubera, finalmente o rumo que daria à sua vida: estudaria com quantas forças tinha, as avaliações seriam bem mais positivas, impressionaria os outros, os seus actos alegrariam aqueles que mais ama, terminaria o 12º ano com distinção, o nunca idiota, sempre genial, iria partir para Inglaterra e do sonho viveria na realidade, enfim, submisso sempre a um papel e a uma esferográfica deslizando em qualquer folha, recriando mundos belos, fantasiando perfeição, semeando alegria e amor sobre todos.
O fatídico 12º ano passara, enfim. Que esperar de Henrique além da fadiga? Belíssimos valores, na pauta da sua escola afixados, espantando todos, invejando muitos, alegrando de orgulho mil tantos outros! Conseguiria média para ir para qualquer curso, para o fazer em Inglaterra!
Provas dadas e concretas tinha dado a seus pais que, sem argumentos, envaidecidos, na hora de comunga alegria e tristeza, acenavam um “Adeus” saudoso na partida de avião de Henrique, a caminho do seu futuro – Inglaterra amada! – “Me aguardem, não chorem, como me custa ver por meus olhos húmidos essas lágrimas naqueles que mais amo; sorriam, sou tão feliz! Hei-de marcar meu espaço, sobrevoar paisagens alegres e tristes conforme a lei da vida intocável e cumprirei meu destino, meu único destino – ser GRANDE!” Como assim ser grande? – “Amar o próximo, amar a vida, as plantas, o ar que respiro, o sol que acaricia minha face, as aves que em cânticos me aplaudem, criar laços, semear alegria, caminhar sobre o Destino que, embora traçado, requer sempre algum esforço de nós para o cumprirmos”.
Nobre Henrique, anos passados na sua Inglaterra, cultivando as flores no jardim do seu coração, agora com 30 anos, e 8 de casado, famoso escritor, conceituado, de ideias originais, eloquentes, quantas vezes conferenciava, alegrando em palavras a enorme plateia! Um génio da Arte de melhor viver! Futuro alcançado, sempre atingido… alegre partia em visita a Portugal, revendo seus pais; saudade!
“Como te amo meu filho!” – palavras melhores que qualquer prémio ou honra, depois de tanta luta, de tantos anos de ausência passados, em ternos beijos e abraços pronunciadas. “Meus pais, amo-vos tanto também! Que saudades senti de vós!” Pais embevecidos, engoliam agora as palavras ternas do filho quando este, com tamanho entusiasmo, lhes contava as tão belas façanhas e tão grandiosas obras que, em país distante, conseguira.
Ao anoitecer, junto àquela janela onde tudo se revelara, no seu antigo e sempre seu quarto, chorou de alegria lembrar que a vida de tão irreal, tão íngreme, tão aparentemente dura e pré-destinada, trás até nós tão belas surpresas, tão reconfortantes alegrias quando, de dentro de nós, nas maiores profundezas do nosso ser, arrancamos a coragem, vontade e o iluminar necessário para a agarrar com força e dela fazermos esboços que com os anos se adensam em traços firmes e com gentileza toda a vida é um triunfo, desde que nós saibamos quem somos, para onde vamos e o que temos a dar aos outros nesta passagem breve de missão terrena.
06/05/2008
Para ti maninho!
Henrique perguntava-se que rumo à vida dar, o que tem como missão viver, o que significa caminhar, o porquê dos objectivos.
Aluno do 12º ano, onde as escolhas são obrigatórias, onde a ânsia aumenta, onde o futuro, essa palavra tão banal, mas igualmente tão irreal, tão “inconcreta”, é decidido, onde se julga depois de tomado um rumo, a rota não mais volta atrás. Dezassete anos de uma vida serão suficientes para que boa decisão do que há de mais precioso – a vida –, seja traçada? Oh, que responsabilidade! Sentia-se num beco sem saída, encurralado, perdido, desanimado, sem saber o que fazer e, mais que tudo o resto, desamparado!
Vida escolar cruel! Rotulado através de um número, por cada professor (detentor de sabedoria), de cada disciplina, muitas delas enfadonhas, aborrecidas, inúteis! Para quê tanto estudo naquilo que, no essencial da tal palavra fatal – o futuro – será irrisório?! Revoltado! Testes infindáveis, avaliações supérfluas das reais capacidades, motivação não estimulada, apoio encoberto… Dezassete anos! Para além de um desajuste entre ele e os colegas; eles excêntricos, perversos, infantis, desmemoriados das consequências dos seus actos para o tal… futuro! Ele maduro, por circunstâncias de vida formado, vivendo num mundo de leves, brandos e criativos sonhares, ilusionista de ideais, criador de personagens, em rascunhos de livros desenhados. Poucos amigos, talvez, mas do melhor! Desejaria mais, mas o mais é indecifrável… o que será que precisaria para lhe encher o seu tão precioso coração?
Um Amor longínquo, não dito, não verbalizado, colado à garganta durante tempo suficiente para sofucar… Ela mais velha, mas de una maturidade igualada! Em tamanha perfeição a pintava, suavemente a pincel, nas profundezas do seu coração e no invisível do seu pensamento.
Alma, num sumar, perdido, destroçado e na essência, sozinho… Um sozinho por entre tanta gente, como Luís de Camões tão bem soubera dizer. Assim ele era, Henrique, um génio recolhido, alma pura e angelical incompreendida. Tão doce ser!
Paixão pelo regresso a Inglaterra, o sonho maior, para além da arte em palavras escritas em livro, quiçá, publicado.
Certo dia, naquele em que reflectia voltado sobre o sol, uma ideia sua alma encheu. Pensou:”Serei eu um idiota? Hum… Os resultados nos testes não são muito famosos, tenho de confessar, mas… meu amor inglês, a Inglaterra sonhada, como os conquistar? Paixão existe apenas em livros, certo é, porque não aprofundar, recriar, fantasiar, dar asas às palavras, colá-las em folhas, projectos empreender… Será que do fazer o melhor que se sabe se atinge o outro patamar, esse caminho mais penoso que é saber o que o futuro (que palavra tão densa e saturada) me é capaz de dar? Serei capaz? Tentarei!” – sorriu e voltou-se nesse mesmo instante para o que o sol lhe oferecia, cerrou os olhos, emocionado porque, naquele tão insignificante de pureza momentâneo soube o que era viver! - “Viver é desfrutar este sol, sentir o seu calor, desfrutar o que meus olhos de belo podem ver, sentir a ligeira brisa fazendo cócegas ligeiras na face, ver a luz que cada pessoa emana e, a partir daí, seguir por um caminho”. Imaginou a vida como uma árvore de tronco forte, enraizada ao solo, carregada de flores e frutos, pesada, densa, alastrada pelos seus imensos troncos, cada um mais fascinante que outro mas, do esplendor, a sombra se via que a árvore produzia sob si mesma. – “Serei sombra? Serei luz? Luz, claro que sim… LUZ! E uma luz tão pura como o sol, tão natural como ele, que dá vida!” – comoveu-se, tão amável Henrique.
A partir de então, todos o comentavam: “Que se passa com o Henrique, parece que ganhou nova vida!” E de facto, verdadeira mudança, igualmente estranha de tão repentina. Que vivia nele, dessa aparente mudança? Soubera, finalmente o rumo que daria à sua vida: estudaria com quantas forças tinha, as avaliações seriam bem mais positivas, impressionaria os outros, os seus actos alegrariam aqueles que mais ama, terminaria o 12º ano com distinção, o nunca idiota, sempre genial, iria partir para Inglaterra e do sonho viveria na realidade, enfim, submisso sempre a um papel e a uma esferográfica deslizando em qualquer folha, recriando mundos belos, fantasiando perfeição, semeando alegria e amor sobre todos.
O fatídico 12º ano passara, enfim. Que esperar de Henrique além da fadiga? Belíssimos valores, na pauta da sua escola afixados, espantando todos, invejando muitos, alegrando de orgulho mil tantos outros! Conseguiria média para ir para qualquer curso, para o fazer em Inglaterra!
Provas dadas e concretas tinha dado a seus pais que, sem argumentos, envaidecidos, na hora de comunga alegria e tristeza, acenavam um “Adeus” saudoso na partida de avião de Henrique, a caminho do seu futuro – Inglaterra amada! – “Me aguardem, não chorem, como me custa ver por meus olhos húmidos essas lágrimas naqueles que mais amo; sorriam, sou tão feliz! Hei-de marcar meu espaço, sobrevoar paisagens alegres e tristes conforme a lei da vida intocável e cumprirei meu destino, meu único destino – ser GRANDE!” Como assim ser grande? – “Amar o próximo, amar a vida, as plantas, o ar que respiro, o sol que acaricia minha face, as aves que em cânticos me aplaudem, criar laços, semear alegria, caminhar sobre o Destino que, embora traçado, requer sempre algum esforço de nós para o cumprirmos”.
Nobre Henrique, anos passados na sua Inglaterra, cultivando as flores no jardim do seu coração, agora com 30 anos, e 8 de casado, famoso escritor, conceituado, de ideias originais, eloquentes, quantas vezes conferenciava, alegrando em palavras a enorme plateia! Um génio da Arte de melhor viver! Futuro alcançado, sempre atingido… alegre partia em visita a Portugal, revendo seus pais; saudade!
“Como te amo meu filho!” – palavras melhores que qualquer prémio ou honra, depois de tanta luta, de tantos anos de ausência passados, em ternos beijos e abraços pronunciadas. “Meus pais, amo-vos tanto também! Que saudades senti de vós!” Pais embevecidos, engoliam agora as palavras ternas do filho quando este, com tamanho entusiasmo, lhes contava as tão belas façanhas e tão grandiosas obras que, em país distante, conseguira.
Ao anoitecer, junto àquela janela onde tudo se revelara, no seu antigo e sempre seu quarto, chorou de alegria lembrar que a vida de tão irreal, tão íngreme, tão aparentemente dura e pré-destinada, trás até nós tão belas surpresas, tão reconfortantes alegrias quando, de dentro de nós, nas maiores profundezas do nosso ser, arrancamos a coragem, vontade e o iluminar necessário para a agarrar com força e dela fazermos esboços que com os anos se adensam em traços firmes e com gentileza toda a vida é um triunfo, desde que nós saibamos quem somos, para onde vamos e o que temos a dar aos outros nesta passagem breve de missão terrena.
06/05/2008
Para ti maninho!